Publicações - 17/06/2025
Publicações - 17/06/2025
O Projeto de Lei nº 2925/2023, atualmente em regime de urgência na Câmara dos Deputados, propõe uma ampla reforma na legislação que regula o mercado de capitais brasileiro, com impactos significativos sobre a responsabilidade civil dos agentes de mercado. Entre os principais pontos debatidos, destacam-se a introdução de instrumentos processuais para a defesa de investidores, a possibilidade de ações coletivas específicas — as chamadas “class actions à brasileira” — e a modificação das regras sobre a responsabilização de administradores e companhias emissoras.
O Artigo 27-G da proposta de lei se tornou um dos eixos centrais do debate, por estabelecer um novo regime de responsabilidade civil dos administradores e controladores, ao mesmo tempo em que gera incertezas sobre o papel da própria companhia emissora. Segundo o texto, os administradores passam a ser civilmente responsáveis por infrações cometidas pelos emissores, enquanto a eventual responsabilização direta da companhia emissora permanece indefinida.
Para especialistas que participaram do evento “Reforma da Lei de Mercado de Capitais: alterações propostas pelo PL 2925/2023” — realizado no dia 27 de maio, em São Paulo, pelo Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) e pelo MKR Advogados — a proposta tende a reforçar a responsabilização individual dos administradores, mas deixa lacunas importantes sobre o dever informacional e a responsabilidade da própria companhia perante o mercado.
O professor Calixto Salomão Filho destacou que retirar a responsabilidade da companhia não encontra respaldo na tradição jurídica brasileira, onde a empresa responde pelo risco do negócio e deve assumir a responsabilidade por informações que presta ao mercado. “Não há razão para que, no mercado de capitais, caminhemos em direção contrária”, afirmou.
Na mesma linha, a professora Mariana Pargendler ressaltou a ambiguidade do texto legal, que, embora vise aproximar o Brasil de padrões internacionais, pode gerar insegurança jurídica ao não esclarecer de forma objetiva se a companhia emissora responderá diretamente perante investidores.
Por outro lado, representantes do Ministério da Fazenda, como Gabriel Saad Kik Buschinelli, indicaram que a proposta busca justamente criar maior segurança jurídica para investidores ao detalhar instrumentos processuais e reforçar a responsabilidade dos administradores. O argumento é de que, hoje, quem pretende responsabilizar agentes de mercado enfrenta barreiras processuais significativas e elevado risco de insucesso.
Outro ponto sensível é a possível redução do escopo de responsabilidade das companhias, deslocando quase integralmente o ônus para administradores e controladores. Como destacou o advogado Felipe Ronco, do MKR Advogados, “há uma forte tentativa de afastamento da responsabilização da companhia, concentrando-a nos administradores, o que pode gerar efeitos indesejados sobre a governança e o funcionamento do mercado”.
A ausência de definição clara sobre o dever de indenizar da companhia emissora é, para vários especialistas, um dos aspectos mais críticos do PL 2925/2023, pois pode elevar a assimetria informacional entre emissores e investidores e aumentar a incerteza jurídica para os agentes econômicos.
Em um mercado de capitais caracterizado pela elevada concentração acionária, como o brasileiro, a reforma proposta pelo PL 2925/2023 levanta questões estruturais sobre o equilíbrio entre proteção ao investidor, segurança jurídica e eficiência na supervisão do mercado.
As discussões seguem intensas, enquanto o projeto permanece na pauta de votação da Câmara, podendo ser apreciado a qualquer momento.